Hoje a caminho do trabalho, no trânsito lento e enfadonho do Recife, ouvia música para não sentir tanto o peso da viagem. Chico perguntava-se para onde vai o amor quando o amor acaba? Belchior diz que o passado é uma roupa velha que não nos serve mais. Bethânia reverência Iemanjá e Oxum com devoção; até que, Paulo Diniz com a voz que cala as buzinas externas dos estressados, indaga a José: José, para onde?
E agora, José ?
José para onde?
E agora, José?
José para onde?
Para onde, José? Para que terra? Para que porto? Para que braços?
A quem você obedece?
Em que você acredita?
Com quem você se importa?
O que te arranca gargalhadas?
O que te fecha o peito?
O que você almeja? Deseja? Procura?
O que tens feito para conseguir?
Quanto tem te custado para chegar lá?
Que tipo de chão tem preparado?
Eita, José?
Onde te enxergas no menino que foste?
Que valores passados por teus pais te impregnaram a alma?
Que amigos plantados no meio do caminho vingaram a frutos?
Voltando-me ao som, Gil convida-me para fugir desse lugar.
Fugir?
Quantas vezes não pensamos em soltar o caçuá que carregamos e sairmos sem rumo, sem lenço, mas com documento, por que ser indigente também a essa altura não voga, né Jose?!
José? E agora, José?
Imaginavas quando era jovem, estar onde estás hoje?
Ligas o rádio pela manhã para ouvir Mauro Ralfeld ensinar-lhe a poupar ou como ganhar seu primeiro milhão?
Você conversa consigo?
Segue orientações de padre, pastor, pai de santo ou cartomante?
Quando foi a última vez que contemplou a lua, que tomou sorvete num domingo cinzento, andou descalço, virou à noite numa farra e bebeu todas?
Que regras você segue?
Para quê?
Qual seu palavrão predileto? Já o proferiu hoje? Foi bom pra você?
O que você pensa dos idosos, dos pobres, das bichas, dos paulistanos e cariocas?
Você retribui um bom dia, solicita licença, pede desculpas, comete gentilezas, toma a benção aos seus pais? Ou tudo isso lhe parece cafona?
Qual sua relação com seu corpo? Você acaricia-o por completo ao banho? Olha-se no espelho e consegue enxergar algo mais que rugas, gordura localizada ou desidratação da pele?
Você já tentou enxergar-se a alma? Tentou identificar-se nas mandalas da família, dos amigos e do trabalho?
Quem eu sou? Quem é você? Quem somos nós? Quem?
Quando paraste diante de si e se questionou, sem passionalismo, que tipo de homem, filho, colega de trabalho, chefe, subalterno, companheiro, vizinho, desconhecido, você é?
Sigo sobre a ponte do Pina, uma curva, um sinal.
Frejat, deseja-me que tenha dinheiro pois, segundo ele, é preciso viver também; mas ressalta, que eu diga a ele quem é mesmo o dono de quem.
Qual sua relação com dinheiro, José? Com o poder e com os olhares? Quantas máscaras você possui?
O que tem te deixado feliz? E quanto tens feito para conseguir? Tens compartilhado os louros com alguém? O que possuis de bom?
Você pratica o bem, José?
Aproximando-me do meu destino, Zizi nos redime a nós, José; ao cantarolar, como um passarinho que anuncia chuva, meninos de braçanã. Revela-nos lindamente que quem anda com Deus não tem medo de assombração; e conclui, eu ando com Jesus Cristo no meu coração.
E tenho dito, pronto.
Júlio Lima
Médico/ Professor