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Fonte da imagem: Internet |
O
Brasil, na última eleição, rejeitou o projeto político que o
governou
por 13
anos e elegeu um presidente de extrema-direita. Observou-se um
processo eleitoral com a sociedade dividida e discursos
de ódio sem
pudores. Veio à lona a imagem de um povo
pacífico,
tolerante com as diferenças e com
as
liberdades. Máscaras descolaram-se e caíram. O
compromisso com a verdade e a ética foi lameado de notícias falsas.
O combate a corrupção era o mote do candidato vencedor, um político
antigo que dizia
fazer nova política. O que terá levado Bolsonaro a vitória e ao
próprio surgimento do Bolsonarismo no Brasil?
A
humanidade se desenvolveu em torno de suas crenças religiosas. No
Ocidente, as três principais religiões possuem origem na mesma
região – Oriente Médio. Em 70 d.c, o Império Romano destrói o
templo de Jerusalém na grande revolta judaica. No Século V da era
cristã surge o Islamismo. Em 638, tropas islâmicas tomam Jerusalém.
Em 1095, O papa Urbano II proclama a primeira cruzada a fim de
auxiliar os cristãos ortodoxos do leste e libertar Jerusalém e a
Terra Santa do domínio muçulmano. A primeira cruzada associado
a
reconquista da península ibérica define o fortalecimento do
Ocidente que, aliado à formação dos Estados e o Imperialismo,
possibilitam o acontecimento dos descobrimentos.
Nos
séculos XVIII e XIX, ocorre na Inglaterra a Revolução Industrial
cuja principal característica foi a substituição do trabalho
artesanal pelo assalariado e com uso de máquinas. Nesse período há
um aumento exponencial do consumo de combustíveis fósseis, sendo o
petróleo seu principal. O controle das reservas desse mineral,
combinado
ao seu uso determinou as mudanças econômicas, sociais e políticas
globais. Com tais mudanças no cenário mundial, o início do século
XX pode ser comparado a um grande caldeirão em ebulição: as
diferenças religiosas permanecem fortes, o aguçamento dos
interesses de classes sociais divergentes e a corrida mundial na
disputa do petróleo. A partir daí dá-se início a uma grande
corrida armamentista, o que aumenta mais ainda a tensão no velho
continente, até que em 1914 sucede-se a primeira guerra mundial, a
qual dá origem, após seu término, aos regimes totalitários.
Ideais nacionalistas tomam conta da Europa, sendo os mais famosos, na
Itália, o fascismo de Mussolini; na Alemanha, o nazismo de Hitler;
na União
Soviética,
o comunismo de Stalin.
Com
o fim da primeira
guerra, na
Alemanha, para eximir-se da responsabilidade pela derrota, toma força
uma teoria conspiratória chamada “punhalada pelas costas”. A
população alemã se fez acreditar e acreditou se vir como vítima.
A imaginação e aceitação (popularização) dessa teoria
deslegitimou o então governo alemão de Weimar ocorrendo sua
desestabilização e abrindo caminho para o surgimento do nazismo,
que não reconhece o Tratado de Versalhes mantendo tensão no
Continente. O
êxito da revolução comunista dos Bolcheviques de 1917, na
Rússia,
constitui-se outro ponto importante de tensão na
região.
Em 1945, a Segunda Guerra Mundial é, entre
outros fatores, resultado
da utilização, por Hitler, do ressentimento que a população alemã
nutria pelas nações vencedoras da primeira guerra, transformando
esse ressentimento em motor para sangria bélica em nome de uma
“consciência
nacionalista”.
A Alemanha de Hitler sai derrotada. Ao
término da guerra emerge-se
duas
grandes potências: a União Soviética e os Estados Unidos,
protagonistas da Guerra Fria, colocando o mundo em total alerta de
destruição nuclear.
No
Oriente médio, centro produtor de maior parte do petróleo mundial,
ocorre a criação do Estado de Israel, em 1948, pelas Organizações
das Nações Unidas (ONU). A decisão aprofunda os conflitos entre
judeus e árabes. Os
semitas advindos
do grande fluxo de imigração estimulados,
em parte, pela
ideia de retorno à "terra santa", além
de, interesses econômicos e estratégicos na região dos
EUA;
enquanto
os mouros,
estabelecidos no território palestino há mais tempo, reprovavam a
ideia de Estado duplo (Judeu/Árabe), bem como a cooptação de
território sagrado pelos Judeus apoiados por grandes potências
imperialistas. A Guerra dos Seis Dias, em 1967, gera ainda mais
conflitos na região. A criação do Estado Palestino se dá em 1988
pela Organização para a Libertação da Palestina (OLP), porém a
maioria das áreas reivindicadas pelos palestinos estão ocupadas por
Israel. Em 1979 acontece a revolução Iraniana ocorrendo a ascensão
do fundamentalismo Islâmico e o fenômeno do terrorismo como parte
do Jihad
(Guerra
Santa) que objetiva o estabelecimento do califado (unificação da
população muçulmana em um único país).
Mesmo
com a Guerra Fria e após seu término, em 1989, com a queda do muro
de Berlin, no mundo ocidental, após a segunda guerra mundial e
declínio de alguns regimes totalitários, experimenta-se um período
de grandes avanços sociais e de políticas identitárias com grandes
conquistas nos direitos dos trabalhadores, de grupos étnicos,
movimento feminista e de minorias alcançando patamar jamais visto.
No entanto, o capitalismo em sua face moderna (neoliberalismo) com o
surgimento e crescimento de novas tecnologias e de mercados reais e
virtuais com a forte presença de especulações faz surgir o
fenômeno de bolhas como, por exemplo, às
ponto com e imobiliárias
sucedendo crises cíclicas ao sistema e tendência ao colapso. Com
isso, o sistema busca, através do sufocamento do proletariado, se
reerguer a cada episódio de crise fazendo com que quem não a causou
que a pague (o trabalhador).
Em
11 de Setembro de 2001, o símbolo do capitalismo mundial é atingido
por um ataque terrorista, fato que já se sucedia em toda a Europa, o
que gerara acentuada
onda de medo e terror nesses países. Aliado a isso, o velho
continente sofre ondas migratórias por refugiados que, segundo a
ONU, é a maior desde o final
da segunda guerra mundial, oriundos da África e Oriente Médio, na
sua maioria, por ações de grupos terroristas, conflitos internos,
perseguições políticas, guerras e violação dos direitos humanos.
O terrorismo, a crise dos refugiados, a crise do capitalismo
neoliberal causado pelas especulações sui
generis
ao sistema, na qual sua existência é incompatível com a manutenção
dos direitos trabalhistas, avanços sociais e políticos conquistados
nos últimos 60 anos são elementos que trazem como consequência o
ressurgimento de ideias e fortalecimento de grupos e partidos
nacionalistas e conservadores de extrema direita.
No
Brasil,
não há como compreender o Bolsonarismo sem a compreensão dos fatos
relacionados da geopolítica mundial, descritos aqui sem o rigor
acadêmico, mas que nos coloca na cena desse fenômeno. Ainda
vivenciamos o período imperialista onde poucas nações, através
dos “descobrimentos”, exploraram as demais numa lógica perversa
de desrespeito à autodeterminação dos povos, soberania nacional e
independência econômico-
cultural.
O
Brasil em sua formação colonial traz a marca dessa influência
invasora e corruptora que, embora não se faça nos moldes
propriamente imperialistas do século XIX, não a torna menos
devastadora. A Ilha de Vera Cruz nasce no berço de conflitos
mercantilistas, cuja violência institucional, percebidas pela
corrupção e matança desenfreada, atingia àqueles cuja terra lhes
pertencia. Grosso modo, o brasileiro carrega uma cultura de
referência de Estado muito negativa. Para os professores Luiz Mendes
Dias e Marcela Souza Pereira, no artigo “Corrupção Política: Uma
história brasileira” há ações corruptas por parte dos
governantes e dos governados em todas as épocas da história do
Brasil.
Uma
cronologia do contexto mais atual, com dados pontuais da realidade do
país e ponderações específicas sobre determinadas figuras se
fazem importantes: ainda no primeiro governo Lula surge o escândalo
do mensalão. A economia do Brasil ia de vento em polpa, bancos
lucrando com nunca, a classe média fazia ponte aérea com Miami e
Europa, os pobres com comida no prato. Caem alguns aliados de Lula,
mas ele é reeleito com 60,83% dos votos; ou seja, Lula é reeleito
com votos de toda a pirâmide social. Em 2010 deixa o governo com uma
popularidade histórica de 87% de aprovação pessoal e de 80% de
aprovação de seu governo.
Dilma
Roussef é eleita e em seu primeiro governo realiza a chamada “nova
matriz econômica” onde atendia os interesses da indústria e
empresariado brasileiro (redução de taxas de juros e tarifas de
energia elétrica, desoneração tributária e crédito subsidiado,
desvalorização cambial e protecionismo industrial seletivo,
concessões de serviços públicos para a iniciativa privada). No
final de seu primeiro mandato, a presidenta tinha 59% de aprovação
e era elogiada por ser responsável pela faxina ética quando demitiu
ministros envolvidos em atos de corrupção.
Dilma
se reelege presidenta da república por uma margem apertada de votos.
O candidato derrotado não reconhece o resultado da eleição. Dá
início no Brasil um movimento com estratégias, por parte dos
derrotados, muito semelhante ao que havia ocorrido na Alemanha no
final da primeira guerra mundial, a “lenda da punhalada pelas
costas”. Aécio então rejeita sua responsabilidade pela derrota
acusando o processo como fraudulento. Há vitimização por parte de
seus eleitores e, assim como ocorreu no governo de Weimar na
Alemanha, a imaginação e aceitação (popularização) da teoria da
fraude proposto por Aécio, desestabiliza inicialmente o governo de
Dilma deixando o terreno fértil para o que viria depois, O
Bolsonarismo.
Outros
elementos, no caso tupiniquim, podem ser acrescidos para o surgimento
do Bolsonarismo, como, por exemplo, a relação da classe média
brasileira com a burguesia e com os pobres. O Brasil foi um dos
países no qual a escravidão foi mais aceita e fomentada. A
libertação dos escravos coincide com o crescimento das grandes
metrópoles brasileiras, já como consequência da revolução
industrial. Os negros saíram da escravidão com os farrapos do
corpo, a fome no
bucho
e
ausência de um teto para se abrigarem. Essa gente, juntamente com
flagelados das secas no Nordeste do país que, como dizia Antonio
Carlos Belchior caia
pela força da gravidade naqueles lugares, sobe os morros e os desce
apenas para servir a uma classe que surgia com a industrialização e
crescimento do comércio, a classe média. Esta impregnada pelo ranço
escravocrata e desejo de um dia se tornar burguês sempre agiu como
tigrona
para os subalternos e tchutchucas para as
elites.
O
Brasil vinha de um período de distribuição de renda e ascensão
social jamais experimentados em sua história pelas mãos de um
trabalhador, que essa mesma sociedade por três outras vezes
rejeitara e se transforma no maior estadista da história do Brasil.
O pobre, o negro na era do Brasil dos trabalhadores, mas não só
deles pelos exorbitantes lucros da elite, agora descia o morro não
mais apenas
para
ocupar o elevador de serviço e o quartinho da empregada, mas para a
universidade, restaurantes e saguões de aeroportos. A classe média
pira, endoidece de vez, o que torna mais fácil a compreensão de sua
vitimização com a derrota de seu candidato a eleição de Dilma.
Na
economia do segundo mandato, a presidenta desagrada o sistema
financeiro e empresarial ao realizar um abrupto ajuste fiscal e
monetário atendendo setores que se colocavam contrários a chamada
“nova matriz econômica”. Enquanto isso, o país fervia saindo às
ruas devido aos espetáculos midiáticos da Lava-jato que levantava a
bandeira anticorrupção capitalizada por um juiz de primeira
instância de Curitiba.
O
então presidente da Câmera dos Deputados, Eduardo Cunha, que era do
mesmo partido do vice-presidente Michel Temer, estava sendo
investigado pela lava-jato
e se colocara como adversário do Planalto após o partido da
presidenta (Partido dos Trabalhadores) não tê-lo salvo no conselho
de ética aonde enfrentava processo de cassação. Somado a isso,
Cunha realiza o jogo de levar a votações pautas-bombas
e reterem pautas de interesse do Executivo. Some-se ainda, além da
vitimização do candidato derrotado nas eleições, o clima
econômico desfavorável e uma copa do mundo aonde a mídia deita e
rola com o jargão “padrão fifa” para ecoar as críticas ao
governo Dilma.
Nesse
balaio de acontecimentos surge um político inexpressivo (lembram-se
da Alemanha?) do ponto de vista de atuação nos últimos 28 anos no
Congresso, que pertencia ao chamado baixo clero, e de rala
qualificação, mas que traz em seu discurso todo o ranço de
pensamentos totalitários que ressurgiu no mundo e que representa os
ideais de uma elite e classe
média que, após terem se beneficiado até
o talo,
deixam o armário que os asfixiavam e expõem seu ódio e rancor
devido alguma ascensão da classe trabalhadora e pela síndrome do
quartinho de empregada vazio.
O
juiz de Curitiba, mais calculista do que emotivo, enxerga mais
adiante e inicia uma jornada em direção ao seu projeto pessoal
maior, o Supremo Tribunal Federal. A essa altura acreditava ele, pois
era o que a mídia colocava e muitos repetiam, ser uma espécie de
super-herói. Surfava nos bons resultados da operação que levara
empresários e políticos importantes para a cadeia. A sua imagem é
então atrelada aos pleitos das viúvas de Aécio que se vitimizavam
ainda pela derrota não digerida e ao político inexpressivo
logorreico, mas cada vez mais popular por expressar o que àqueles
que mais se beneficiaram dos governos petistas queriam ouvir. O então
Juiz passa a atuar, segundo publicado pelo site Intercept
Brasil, mais
político do que juridicamente. A fim de que nada desse errado em seu
objetivo maior e a opinião pública o protegesse, trata ele mesmo de
se lançar como mentor, articulador, condutor dos processos e
julgador de alguns casos da lava-jato, dentre eles o que tratava do
ex-presidente Lula. Ao procurador-chefe da operação restara-lhe,
ainda segundo o que até então foi publicado por Veja, Folha de
São
Paulo e Intercept
Brasil,
cumprir ordens e se contentar em enriquecer com palestras
relacionadas
ao
caso.
Então,
Luis Inácio Lula da Silva é preso e julgado em tempo recorde para
os padrões nacionais, com aparente atuação plena do Juiz na
cronologia e temporariedade dos julgamentos e ações no processo, o
que garantiria a ausência de Lula no pleito eleitoral de 2018
associando
mais a sua imagem ao candidato Bolsonaro.
O país assolado por fake
news,
imprensa comprometida, povo letárgico, nesse clima, Bolsonaro é
eleito Presidente da República. Como prêmio, o Juiz de Curitiba
recebe o Ministério da Justiça o consequente comando da Polícia
Federal, até que uma prometida e tão sonhada cadeira do STF
desocupe por aposentadoria ou por morte de um de seus membros.
Nos
sete meses passados do atual governo observa-se retrocessos na área
do meio ambiente, política externa, educação, direitos sociais e
trabalhistas, além de previdenciário e estamos apenas no seu
começo. Parte da sociedade e da imprensa outrora confiante no atual
governo já não comunga com o mesmo. O intercept
Brasil, revista
Veja e jornal Folha de São Paulo prometem muito mais revelações,
mas as fazem a conta-gotas, no entanto, a imagem do mocinho
super-herói
do Juiz vai se tornando desfigurada e esfacelada.
Será que atingimos
o fim do poço? Quanto falta até lá? Até onde irá essa letargia
do povo e
quando acordará desse surto coletivo?
Quem está sendo contemplado com esse governo? Até quando a classe
média sonhará em ser burguesa servindo de tapete para a elite
abanando-lhe
o rabinho
e de espinho para os pobres?
Eu,
esperançoso e crente que sou, fico com as palavras do papa
Francisco: A verdade vencerá a mentira.
Júlio
Lima
Médico