quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

Homos sapiens: a batalha no ano da estrela de Belém


Imagem: Internet

Homos sapiens: a batalha no ano da estrela de Belém

2020 foi um ano propício ao aprendizado e, como tal, ele não nos chega de maneira fácil, senão, também pela dor. A segunda metade dessa década (desde 2016) foi marcada por mudanças radicais em todo o planeta.

O individualismo Romano (pré-cristão), um cristianismo antigo-testementário, um saudosismo à práxis da idade das trevas, a ufanização de práticas desumanas vistas na era Mussolínica e Hitleriana, a distorção de fatos, assim como, a ausência de compreensão deles fizeram com que deixassem do submundo do obscurantismo verbos, gestos e condutas que se pensava, até bem pouco tempo, enterradas pela humanidade.

Retornamos à caverna Platônica e muitos passaram a vislumbrar um mundo projetado de maneira distorcida pelas sombras geradas pelo fogo da ignorância e do desamor. Muitos, muitos passaram a enxergar um mundo e realidades completamente diferentes. A curuminha retornara a escuridão do ventre. Um ventre podre, fétido de ambiguidades, mentiras e ódio abundantes. Um ventre ganancioso, ávido por encarcerar para sempre, o que seria a luz, a liberdade, os valores e sentimentos humanistas.

A caverna de Platão, o útero obscurantista encontrava-se repletos de casulos que nesses tempos eclodiram. Líderes amorais e insanos dão voz e representatividade a uma massa de caverdianos que, sentindo-se espelhados e, principalmente, encorajados, eclodem e saem do armário, pois ali era, é, o mundo, a verdade que os alimenta, os fortalece, os une.

Quem ousa ou consegue sair da caverna, já não volta mais, pois como dizia Socrates à Glauco, seus pares os julgarão como loucos.

No entanto, o mundo externo e a caverna estão sujeitos às mesmas leis da natureza e, nesse fatídico 2020, ambos habitantes desses “lugares” são contaminados por uma nova praga, o Coronavírus.

Enquanto o mundo externo tenta desvendar os segredos desse novo vírus, os caverdianos negam sua importância e letalidade. Enquanto o mundo externo se preocupa com o bem-estar das pessoas, os caverdianos lutam para que nada mude, pois os braços que produzem não podem parar.

A ausência de luz contida no íntimo de cada caverdiano e a distorção da realidade traduzida na imagem criada pela penumbra da fogueira Platônica, em detrimento dos que vivem naturalmente no mundo externo, faz com que o corona vírus ( não sua infecção, mas sua existência), em 2020, exponha duas subespécies de Homo sapiens que habitam o mesmo planeta Terra. Compartilham a mesma família, a mesma sala de aula, o mesmo escritório, a mesma praça e até a mesma cama.

2020 tentou, a seu modo, dá-nos tempo para a reflexão, a introspecção, a mudança. Seu veículo, o vírus, fechou igrejas, templos, terreiros, mesquitas, sinagogas, empresas, casas de espetáculos e shoppings. Mandou todos para casa, tudo isso para nos dá a oportunidade do aprendizado. Um número exorbitante de pessoas sentiu a doença em sua face mais perversa, outros milhares ficaram órfãos de parentes, amigos, conhecidos, ídolos. Ninguém esteve imune, no entanto, muitos, muitos preferiram ver tudo através da fumaça que produzia a distorcida sombra. E, por não entrever, permaneceram na negação, na afronta, no confronto. Sem nada distinguir pela quimera na caverna. Avistavam apenas seus umbigos inundados de ódio, rancor, agressividade e incapacidade de se albergar no lugar do outro.

No entanto, “o pulso ainda pulsa”, a luz ainda brilha e, mesmo a despeito de tanta iniquidade, muitos, muitos, muitos, muitos outros sabem que “ a canção não está perdida” e a alma vibra com fervor.

A fé em Deus, nos Orixás, em Buda, Maomé, nos Astros, na vida, a fé que “não costuma faiá”, os mantém fortes e combativos. Fazem da esperança, o caminho; da coragem, a condição; da solidariedade, a concórdia; e do amor, o combustível para seguirem em frente.

Há quem diga que mesmo os bons, sem fé, saem em desvantagem para a batalha cotidiana entre o mundo externo e os “habitantes” da caverna. A oração, o mantra, a meditação são as munições nessa contenda.

Esse ano finda e um novo há pouco rebentará. Navegar é preciso, viver é fundamental.

Começar, recomeçar, poder contar com o outro e se fazer disponível... valerá a pena toda a luta, toda dor, toda virada de mesa, todo conhecimento colhido, toda rebeldia, toda noite mal dormida, toda ansiedade vivida, toda introspecção, ter se conhecido e, por fim, ter sentido todo o ar respirado.

Que a lembrança do nascimento do verdadeiro Cristo e as manhãs do ano sequente nos tragam a luz, cada vez mais brilhante, de um brilho tão intenso que inundam as mentes e os espíritos no mundo externo, assim como, e principalmente, no buraco-soturno.

Que as sombras sejam dissipadas e as cores refratadas façam todos perceberem que mesmo sendo indivíduos, são unidades imprescindíveis para a boa função do todo, e que, para serem completos, necessitam uns dos outros, enxergando em cada irmão, a si.

Que o verdadeiro Cristianismo, tais como, os verdadeiros ensinamentos e exemplos deixados por Jesus Cristo sejam observados, propagados e reproduzidos.

Júlio Lima

Médico/ escritor