“Sou de uma terra que o povo padece,
mas não esmorece e procura vencer”. Dizem os versos do poeta Patativa do
Assaré.
Sou da região do Cariri Cearense, do
lado de lá da Chapada do Araripe, Sul do Ceará. Devido à proximidade com o
Pernambuco, nossa região sempre sofreu uma forte influência acadêmica, social,
cultural e até linguística do lado de cá da Chapada.
Lembro-me ainda criança, ouvir
histórias do Recife contadas por àqueles que vinham aqui estudar. Boa Vista,
Rua do Sol, Rua da Aurora, Rua do Príncipe eram nomes que, desde muito cedo,
povoavam o meu imaginário. Achava Incrível, os lugares serem nominados dessa
forma. No Juazeiro do Norte, todas as ruas possuem nomes de Santos: Padre
Cícero, São José, Santa Rosa, Santa
Luzia, Todos os Santos e por aí vai.
Como todos daquele lugar, sou de uma
família muito religiosa, estudava em colégio de freiras e morava numa cidade
que recebia milhares de romeiros anualmente.
Pessoas de todos os recantos do Nordeste que ao nos visitar, nos
presenteavam com suas oralidades, maneiras de serem e agirem.
O encontro com toda essa gente, que
iam frequentemente à terra do meu Padim, vindas principalmente da Paraíba, Pernambuco e
Alagoas, acabava trazendo uma maior identidade nossa com esse povo; até mesmo,
maior que o restante do Ceará central e do Norte, onde fica a capital.
Muito jovem, fomos morar em Fortaleza
levados por meus pais. Pessoas com pouco estudo, no entanto, com vista larga.
Um casal que abriu mão de alguma estabilidade que tinha, para oferecer
possibilidades aos seus filhos. Pais extremamente amorosos, porém bastante
disciplinadores.
Costumo dizer que a criança, o
jovem, na educação doméstica até aprende com os ensinamentos verbais, mas
aprendem principalmente com os exemplos de quem representam autoridade.
Como hoje estou sendo adotado por
essa magnífica cidade, também fui, na infância, por uma admirável família que
juntamente com meus pais conduziram minha formação humanista, ética e moral.
Nessas famílias, aprendemos sobre
tudo, a respeitar e valorizar o Ser Humano; O valor de ser verdadeiro, ser honesto
consigo mesmo e com o outro.
Aprendemos que rir mais, trás felicidade e
percebermos que é inteligente sermos gentis, buscar um equilíbrio entre o trabalho
e o lazer, poder usar terno e andar descalço, correr no sol e banhar-se na
chuva,
Ser
firme em seus propósitos, mas nunca perverso. Ser competitivo, sendo também leal. Buscar posses sem ser avarento. Exercer o
poder e não ser tirano. Gostar do azul, mas respeitando quem prefere o
vermelho;
Aprendemos
ainda, que nunca se chega a um objetivo sozinho e que devemos diuturnamente
reconhecer e agradecer àqueles nos ajudaram e ajudam.
Aprendi que não há equilíbrio sem uma forte
ligação com o ser divino, com a fé, pois ela é a matéria prima para o grande
enfrentamento desse fantástico espetáculo que é a vida.
Para
nós, Cearenses do cariri, Fortaleza era uma terra longínqua. Só quem subia a
ladeira do Juazeiro à terra do sol eram aqueles, como foi meu caso, cujos pais
trabalhavam em empresas estatais e não lhes restava outra solução.
Recordo-me
da boa inveja que sentia quando encontrava minha prima, aqui presente Val e
ouvia atenciosamente seus relatos sobre a efervescência da cena cultural da
Zona da Mata pernambucana. Tudo aqui era muito bom em seu discurso.
Recife
já era nos anos noventa, o segundo polo médico do País e, também por isso, para
mim era um sonho, um objetivo a ser conquistado.
Ainda
em Fortaleza, estive presente ativamente dos movimentos estudantis e culturais
da cidade. No último ano do ensino médio, antigo segundo grau, participei da
montagem da peça “Morte e vida Severina”
e assisti, em praça pública, a um espetáculo que reunia Antonio Nóbrega
e Alceu Valença, no qual mostravam várias vertentes da cultura Pernambucana.
Essa superdosagem de pernambucanidade, aliada a excelência da Medicina aqui
praticada, foram decisivas para vir ao Recife fazer meu primeiro vestibular.
Era aqui no Recife que eu queria morar.
Não
cheguei pelo mangue como o Severino de João Cabral, mas visualizei a beleza do
Rio Capibaribe e me apaixonei.
Quem
conhece Recife e de sua fonte urbana bebe, jamais a esquece, jamais consegue
deixá-la por completo. Como diz o poeta Nilo Pereira – “Essa cidade é mágica,
meio bruxa, enfeitiça, quebranta, tira as forças”.
Anos
depois, viria estudar e morar definitivamente nesta cidade tão bela, tão rica
de recursos humanos e tão cosmopolita.
Aqui
fiz muitos amigos, vivi grandes paixões e também aqui plantei minha semente
profissional.
Fiz
residência médica no Hospital Getúlio Vargas, lugar pelo qual cultivo grande
apreço e ainda sinto como minha casa, pois lá ainda se encontram grandes
mestres.
Viver
em Recife, trabalhar nos lugares que trabalho, conviver com as pessoas com que
convivo faz de mim um homem feliz e realizado.
Agradeço
a Deus e a Maria Santíssima por ter me dado às famílias e os amigos que me
deram; e por terem colocado as pessoas certas em minha trajetória.
Agradeço
ao Real Hospital português (pela credibilidade em meu trabalho), A universidade
Maurício de Nassau (por permitir-me que faça parte de sua história), a AACD (
por conceder que eu realize um trabalho no qual tanto acredito e amo tanto) e
ao Hospital de Fraturas ( Por ter sido o primeiro a acreditar em mim e me
estender a mão após a residência).
Agradeço
ao povo do Recife que só o bem tem me feito e alegria tem me dado.
Agradeço
a Vereadora Dra. Vera Lopes pela sensibilidade, amizade e pelo reconhecimento
ao amor e sacerdócio com que exerço minha profissão.
Agradeço
aos meus pacientes, aos quais dedico meu ofício, meu amor e meu respeito
profundo.
E,
finalmente, obrigado a Cidade do recife por me acolher como filho e por tanto
júbilo ter me dado.
Júlio Lima
Recife 25/10/12